quinta-feira, 7 de abril de 2011

Maria-flor do caminhão



Manhã de domingo, pacata como sempre. Maria sentada na calçada, conversando futilidades, aquelas que não deram para serem ditas nos intervalos dos dias.
De repente silêncio, pela falta do que mais dizer ou pela monotonia do dia e da vida, Maria cala e sente o nada ao redor.
É sempre assim a vida, como uma manhã de domingo, lenta, morna e insalubre, pronta para você botar de molho suas mágoas e mancadas. Ela ferve, mas você não consegue desligar e tudo explode na segunda-feira.

No silêncio da manhã de domingo Maria botava sua vida pacata de molho. O caminhão de lixo que passava impede de ir ao fogo, como se o fósforo falhasse. Maria acompanhava o movimento dos garis. Eles paravam nos instantes da rua nua, recolhendo os pontos “impuros” do mundo. O caminhão fazia a travessia, ajudando os sacos a chegarem no purgatório e esperar seu destino.
No trabalho de pegar e jogar no caminhão, uma flor é expulsa do veículo. Não era sua hora, assim como a panela com a vida de Maria cai no chão para não ser esquentada. Também não era sua hora. 
A pequena flor de plástico, alegoria da beleza compartilhando lugar com "o que não prestava" para a sociedade. O feio, o sujo e o belo unidos.
Maria atravessou a rua para pegar a flor do asfalto quente, para juntá-la a sua vida, talvez não tão insalubre quanto pensava...

3 comentários:

  1. "É sempre assim a vida, como uma manhã de domingo, lenta, morna e insalubre, pronta para você botar de molho suas mágoas e mancadas. Ela ferve, mas você não consegue desligar e tudo explode na segunda-feira."

    Gostei dessa parte.
    E da reflexão para olharmos bem pras coisas para nossa vida ser menos insalubre. :D

    Parabéns

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  2. Acho que as vezes somos tão extremistas, ou está tudo bom ou está tudo ruim, e sabemos que não é bem assim!
    Obrigada pelo comentário, Mona :)

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  3. Sabe de uma coisa? Há tanta nostalgia ao lembrar das manhãs de domingo e há muita poesia quando se compara a vida a um caminhão de lixo. Mas não uma poesia pseudo-interessante, não. Uma poesia que faz a gente refletir. E afinal, como é a vida diária?

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